- 10/11/2024
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Iraque pode permitir casamento infantil e restringir direitos das mulheres
O parlamento iraquiano está prestes a votar uma proposta de emenda que pode reduzir a idade mínima para o casamento legal de 18 para apenas nove anos. A mudança visa alterar a Lei de Status Pessoal — legislação que atualmente regula as questões familiares no país. O jornal britânico The Telegraph reporta que a iniciativa parte de uma coalizão de partidos muçulmanos xiitas, com forte influência sobre o parlamento e o desejo de adaptar a legislação a uma interpretação rigorosa da lei islâmica.
Além de permitir o casamento infantil, a emenda busca limitar os direitos das mulheres em questões como divórcio, custódia de filhos e herança. Os defensores da proposta argumentam que essas mudanças serviriam para proteger as jovens de “relacionamentos imorais”, enquanto ativistas veem a medida como uma ameaça direta aos direitos conquistados pelas mulheres no Iraque.
De acordo com o Dr. Renad Mansour, pesquisador da Chatam House, uma organização com sede em Londres que analisa questões internacionais, essa coalizão xiita tem influência suficiente para aprovar a emenda. “É o momento mais próximo que já estiveram de conseguir essa mudança”, afirmou Mansour, ressaltando que, embora nem todos os partidos xiitas apoiem a medida, o bloco dominante está fortemente empenhado em aprová-la.
Retrocessos nos Direitos das Mulheres
A ativista Sarah Sanbar, pesquisadora da Human Rights Watch no Iraque, alerta que, se aprovada, a proposta representará um retrocesso significativo nos direitos das mulheres. “Isso apagaria os principais direitos delas”, disse ao The Telegraph. A jurista Athraa Al-Hassan, especialista em direitos humanos, também demonstrou preocupação, afirmando temer que o Iraque se torne governado pelo sistema de “Tutela do Jurista”, em que o poder religioso se sobrepõe ao Estado — uma estrutura já estabelecida em regimes como os do Afeganistão e do Irã, onde o “Jurista Guardião” detém o controle supremo.
Casamento Infantil e Desafios Legais
Embora a idade mínima oficial para casamento seja 18 anos no Iraque, a Unicef estima que 28% das meninas no país já se casam antes dessa idade, graças a uma brecha na lei que permite que líderes religiosos realizem casamentos de meninas de 15 anos, desde que autorizado pelos pais. Essas uniões, no entanto, não têm amparo legal, o que deixa as jovens e seus filhos sem acesso a diversos direitos fundamentais. Se aprovada, a nova emenda legalizaria esses casamentos informais, colocando meninas em maior risco de abusos e dificultando seu acesso à educação e ao mercado de trabalho.
Conflitos e Protestos
A proposta tem gerado protestos em todo o país. Ativistas e defensores dos direitos das mulheres têm condenado a iniciativa, acusando o governo de tentar “legalizar o estupro infantil”. Durante as manifestações, opositores da proposta enfrentaram grupos que apoiam a emenda, sendo chamados de “moralmente decadentes” e acusados de promover “agendas ocidentais”.
Segundo o The Guardian, o Quadro de Coordenação — coalizão iraquiana com laços estreitos com o Irã e que domina o cenário político desde 2021 — tem avançado com outras leis conservadoras, como a criminalização da homossexualidade e da transexualidade no país.
Novo Papel para as Autoridades Religiosas
Ao contrário de países como a Arábia Saudita, o Iraque ainda não conta com um sistema de tutela masculina que exija permissão de um homem para que uma mulher tome certas decisões pessoais, incluindo o casamento. No entanto, a nova emenda permitiria que líderes religiosos tivessem autoridade sobre questões familiares, o que, segundo críticos, representa um perigoso movimento em direção ao controle religioso direto sobre a vida privada dos cidadãos.
Gazeta do Povo